Espículas de Chondrocladia lampadiglobus
Chondrocladia lampadiglobus é uma esponja CAR-NÍ-VO-RA! Ok! Talvez isso não lhe
pareça nada demais, mas foi um nocaute para os cientistas. Depois que o
atordoamento inicial passou veio o frenesi, pois até 1995 acreditava-se que só
existiam esponjas FILTRADORAS. Esses organismos, inclusive, pertencem ao filo
porifera que é assim denominado por conta dos poros, tão necessários a
circulação da água em seu interior, de onde retiram a matéria orgânica. Correspondem
aos invertebrados mais primitivos, todas as trocas são feitas ainda célula a
célula, tipo uma briófita do reino animal. Sim esponjas são animais, não
plantas como se pensava no inicio do século 19 (e sim, em pleno século 19 ainda
não sabíamos direito sobre que peste eram esses organismos!). Então, são animais sésseis, coloridos,
filtradores ou... CARNÍVOROS desde 1995, quando se descobriu em cavernas
submersas no Mediterrâneo a primeira esponja carnívora: Asbestopluma hypogea, que não dá nome a esse blog por não ser tão
bonita quanto a Chondrocladia
lampadiglobus, que só foi descoberta em 2006!! A Chondrocladia é uma esponja
de águas abissais com cerca de 50 cm de altura, com bolinhas translúcidas de 3 a 5 mm presa numa aste comprida. Os pequeninos organismos do plâncton
ficam presos nessas bolinhas e são digeridos e distribuídos pelo resto do
organismo, nem sombra de alguma estrutura parecida com um órgão ou um sistema
circulatório, tudo célula a célula.
Perguntei-me logo: o que os fez identificar aqueles organismos como esponjas
se não possuem o sistema aquífero e os poros tão característicos desse grupo??
Por sorte as esponjas carnívoras possuem espículas que também são bem
características do filo, creio que teriam se confundido muito mais caso
encontrassem esponjas carnívoras sem espículas. Muitas espécies não possuem
essas estruturas silicosas ou calcáreas que servem para dar sustentação ao
organismo, é como se fosse um monte de pedacinhos de vidro mergulhados numa
gelatina (é bem isso mesmo!). Os "cacos de vidro" possuem formas específicas que
ajudam a identificar as espécies, nem todas possuem os tais vidrinhos (espículas)
possuindo uma estrutura menos resistente, sendo formada apenas por fibras de espongina.Entre os 28 filos de invertebrados aquáticos, as esponjas correspondem
a um dos grupos mais diversos em número de espécies e variabilidade de
caracteres morfológicos. Cerca de 8000 espécies são conhecidas atualmente, e
com grande potencial para descobertas de espécies novas, pois seus estudos
taxonômicos são recentes e pouco se sabe sobre as relações filogenéticas desse
filo. Gosto de imaginar nos oceanos Paleozóicos e antes, um conjunto de células
ciliadas (coanócitos) se particularizando, desenvolvendo displicentemente a capacidade de
coordenação de seus cílios a ponto de direcionar um fluxo de água
que lhes promovessem alguma vantagem na retirada de matéria orgânica que era
repassada célula a célula entre o grupo. Os primeiros registros de esponjas datam de
aproximadamente 500 milhões de anos, quando houve a explosão de registros
fósseis do Cambriano. Uma grande quantidade de invertebrados marinhos
encontram-se nesses registros, os extintos e famosos trilobitas, por exemplo. Os
mares eram dos invertebrados! Ou os mares eram dos braquiopodos (como preferir)
pois de 10 a 20% de toda a fauna marinha do cambriano era composta por braquiopodos,
o restante correspondia a gastrópodos, equinodermas, cefalópodos, artrópodos e...
esponjas. Por serem o filo mais primitivo de invertebrados, acho fascinante
estudar suas estratégias evolutivas que lhes permitiram habitar os mais
diversos ambientes aquáticos desde águas límpidas dos recifes, a profundezas
abissais, águas tropicais do Caribe a águas gélidas do Ártico, além de rios,
onde também são encontradas e até podem criar problemas. Há alguns anos foi notificado
um surto de irritação nos olhos em uma comunidade próxima do rio Araguaia,
Araguatins no estado do Tocantins, e que foi atribuída possivelmente a presença
de espículas de Cauxi (Porífera, Demospongiae) no sedimento e em suspensão na
água (Volckmer-Ribeiro e Batista, 2007). Esses animais são conhecidamente
tóxicos, podem causar alergias e outros problemas. Uma série de compostos
químicos tem sido extraídos de diversas espécies, principalmente a partir da
década de 90, com grande interesse para a indústria de fármacos.Dentre as inúmeras curiosidades das esponjas, McMurray et al (2008) comenta sobre um exemplar de Xestospongia muta encontrado no Caribe com mais de
um metro de altura cuja idade com base na sua taxa de crescimento e diâmetro,
foi estimada em mais de 2300 anos. Certo, é possivelmente o animal mais antigo
do mundo! O que lhe valeu o apelido de “Redwood of the reef” (Secóia do
recife). Já tive a oportunidade de ter uma Xestospongia
muta nas mãos, me falta mergulhar e
vê-la imensa em seu habitat natural com todos os asteroidea, brachyura e tudo mais que vive e usa sua estrutura “furadinha”
e os canais de seu sistema aquífero, é um ecossistema inteiro! Fantástico mesmo deve ter sido a equipe do
francês Vacelet que descobriu a Chondrocladia...
minha imaginação começa logo a saltitar...
imagino o equipamento de câmeras descendo 100m... 200... 500...1000m... águas
escuras, animais raros e fluorescentes, cada vez mais raros (de verdade!), um
ambiente espacial, mas que depois de horas olhando um monitor escuro e ermo se
torna um tanto entediante. Eis que de repente, não mais que de repente, surge
uma estrutura com bolinhas presas numa aste... uma estrutura com bolinhas presas numa aste!!!